A difícil arte de ser simples

Wanderlino Arruda

Há pouco tempo, como diria o radialista Luiz Tadeu Leite em sua linguagem típica, fiquei "na mão de calango", com um artigo sobre o "Domínio da Cultura", publicado aqui neste JORNAL DE DOMINGO. Feito, no meu ponto de vista, para um relativo proveito didático, mesmo antes de publicá-lo eu já estava meio desconfiado da imperfeição comunicativa que iria encontrar. Foi as­sim que pedi ao Waldyr Senna Batista e ao Márcio Antunes para lê-lo e me dar uma opinião a respeito, pois, se positivo, eu continuaria na mesma linha, formando com uma série de igual nível, um volume de Semiologia e Lingüística, para posterior publicação em livro. Nem de Waldyr nem de Márcio recebi qualquer observação. Um grande silêncio foi o resultado.

Publicado, no domingo cedo, mostrei-o diretamente ao pessoal de casa, mulher e filhos, pedi opinião. Todos tentaram ler, começaram interessados, mas, no primeiro imprevisto, deixaram o jornal de lado, sem qualquer comentário, fazendo-se de esquecidos. Mais tarde, em visita ao meu irmão Jurandi, fiz outra experiência com a minha cunhada Raquel Santos Arruda, ex-aluna de quatro anos do curso de Letras, na Faculdade de Filosofia: dei-lhe o artigo sem nada dizer, para não forçar sua opinião, pois seria interessante saber o que uma bacharel em língua e literatura, portadora de conhecimentos de lingüística poderia achar. Negativo e bem negativo: na primeira interrupção dos meninos, Raquel deixou tudo de lado; sem nada comentar. Foi um desastre. Só terminou de lê-lo a meu pedido. Desculpando-se de ter estudado o assunto há muito tempo, não estava entendendo quase nada. . .
Numa das reuniões do Rotary Clube Montes Claros- Norte, já ressabiado, perguntei de queima-roupa ao Waldyr o resultado da sua leitura. Da sua ou da do Márcio, a quem entreguei o original, pessoalmente, na oficina. Nenhum dos dois havia lido, assegurou­me. Quem fez a leitura de revisão foi o diretor Oswaldo Antunes, que informou não ter gostado, achando tudo muito confuso, complexo, por demais erudito. Aliás, erudito foi a palavra de "chamada" na capa do Caderno quando da alusão aos diversos escritos daquele número. Teria sido um desastre o meu artigo? Tão confuso ao ponto de não agradar a ninguém? Teria eu tido pelo menos um leitor?
Em outra reunião do Rotary, encontrei o Oswaldo e dizendo saber que a revisão tinha sido sua, gostaria de ter um comentário, mesmo sabendo pelo Waldyr que não era favorável. Afinal, um diretor tem de estar preparado para as coisas de alta, média e baixa erudição. . . Oswaldo riu, ficou sério, e disse-me que o artigo tinha sido um desastre também para ele: não tinha entendido nada, coisa nenhuma. Era a segunda vez que não compreendia um texto na sua vida. Houve, há algum tempo, um livro que não conseguiu assimilar de tão confuso que era. Agora, o meu artigo tinha posto no seu caminho um novo desafio de incomunicabilidade. Que coisa terrível era aquilo? Melhor eu escrever de novo explicando tudo, artigo explicando artigo, em linguagem de gente . . .
Mas nem tudo está perdido! Homem nenhum é uma ilha! Encontrei alguém que gostou de meu "escrito". Gostou e elogiou. Elogiou e aprovou. Saindo para o almoço, depois de um período de trabalho no Banco do Brasil, encontrei-me no saguão com o meu amigo e companheiro José de Freitas Soares, o famoso Zezinho Padeiro, sempre interessado, curioso e amante de muitas lei­turas, que, alegre como sempre, deu-me um abraço e me confidenciou sinceramente que havia apreciado muitíssimo "aquele meu artigo sobre cultura", "uma maravilha", tão bom que eu deveria con­tinuar publicando outros no mesmo assunto.
Foi um alívio . . . um grande peso saiu de minha consciência lingüistica e semiológica, Zezinho, meu amigo Zezinho, salvou-me do fracasso, e eu muito lhe agradeço. Obrigado, Zezinho! Prometo tentar assuntos mais simples e mais pedagógicos. . .