Ruth Tupinambá

Wanderlino Arruda

Muito tempo atrás, num comentário que fiz no Elos Clube sobre Hermes de Paula, falando da continuidade de escrita da história de Montes Claros, apontei a acadêmica Ruth Tupinambá Graça como a pessoa indicada para essa importante tarefa. Sei que alguns elistas até puderam ter julgado minha opinião como fruto de entusiasmo de momento, um arroubo de palestrante amigo e companheiro. A própria Ruth Tupinambá deve ter pensado o mesmo, pois sorriu descrente, nunca se colocando como continuadora da obra do nosso mais famoso historiador. A memória recente sobre Hermes de Paula, principalmente agora no seu Centenário, ainda é muito viva. A admiração por ele é incontestável, a visão de sua luta diária com os acontecimentos o coloca como insubstituível e, por isso, ainda não se firmou o pensamento de que a história não pára e exige outro acompanhante.

Continuo, pois, dizendo que depois de Hermes de Paula, mesmo passado meio século da publicação do seu livro principal, deve vir Ruth Tupinambá Graça. Não só deve, como precisa que venha. Precisamos de alguém que conheça a cidade e sua gente, alguém que goste do trabalho de registrar acontecimentos e de marcar as presenças das personagens nesses acontecimentos. Alguém que tenha amor suficiente à cidade e que saiba como manusear as palavras para pintar e descrever os momentos dignos de registros. Precisamos, sobretudo, de uma pessoa que seja, ao mesmo tempo, repórter, cronista, documentadora e contadora de histórias. E estas qualidades a autora de “Montes Claros Era Assim...” tem de sobra. Sem nenhuma intenção de fazer trocadilhos, posso dizer que Ruth Tupinambá tem muita graça para isso. Escreve com a suavidade de quem toma banho em cachoeira, com limpidez e transparência.

Ressalte-se também o fato de ela conhecer muito bem o passado de Montes Claros, desde quando se entendeu por gente. Menina curiosa, versátil, muito inteligente e perspicaz, ela observou tudo e, às vezes, até acompanhou e viveu muitos episódios, principalmente a atuação das pessoas, as visões de cortes sociais, os ambientes, as mudanças físicas e psicológicas. Analista da alma humana, Ruth Tupinambá alcança cada gesto, cada piscar de alegria, cada remoer de tristezas. Em tudo ela vê cores, sons, dimensões, o amor ou o desamor, as crendices, o folclórico. Ruth tem imensa saudade de todas as horas, e isso lhe dá condições de sempre refrescar as lembranças da memória e do coração. Parece-me um bom passaporte para a posição de historiadora, pelo menos para a criação da história apaixonada como sempre o fez Hermes de Paula.

Já quase sem espaço nesta crônica, quero dizer que o livro “Montes Claros Era Assim...” é uma boa oportunidade de conhecermos o passado da cidade, esse conjunto de gente sertaneja e vivedora que soube crescer e multiplicar. É bom, minha senhora, ler depressa (ou devagar, conforme o gosto) todas as crônicas do livro de Ruth Tupinambá para saber tudo ou, pelo menos, o lado mais interessante das coisas e das gentes. Nelas estarão os “cometas”, os bruaqueiros, o velho Christoff (pai de Konstantin), o velho João Maurício, o primo Luís, o Sinval Amorim e seu bar, a Euterpe Montes-clarense, o Cine Montes Claros, o “footing” da Rua Quinze, as boiadas, os carros de bois, os circos, a brincadeira da argolinha, a Matriz, um grande universo de assuntos que marcam saudades.

Depois da leitura, pode vir o julgamento se Ruth Tupinambá é ou não nossa real e experiente historiadora, testemunha ocular e personagem ao mesmo tempo. Tudo com muito amor!

Institutos Históricos e Geográficos de Montes Claros e de Minas Gerais